Pedro Carlos Gama da Silva e outro
O
Semiárido brasileiro é um
dos mais povoados do mundo e, em função
das adversidades climáticas, associadas
aos outros fatores
históricos, geográficos e políticos que remontam centenas
de anos, abriga
a parcela mais pobre da população
do país (NORDESTE...,
1999). Grande parte
da população que
vive nessa área está diretamente vinculada a atividades
agropastoris e busca seu sustento sobre a
base de recursos
naturais existentes em suas propriedades
ou no entorno destas. Tais atividades são altamente dependentes da chuva
e, em razão
das adversidades climáticas, com ciclos de secas
acentuados, resultam em forte degradação
ambiental.
Estudos realizados em ambientes
semiáridos demonstram uma estreita ligação da atuação
do homem sobre
o meio, com processos negativos sobre a flora e
a fauna silvestre
e, principalmente, sobre
os solos, onde
os processos erosivos se intensificam e
passam a constituir indícios
marcantes de desertificação, estando o clima
fortemente associado a este contexto.
Aspectos
naturais
A
característica marcante da região semiárida é a ocorrência de uma variedade de
paisagens e ambientes. A região semiárida contempla 17 grandes unidades de
paisagens, por sua vez subdivididas em 105 unidades geoambientais, de um total
de 172 no Nordeste como um todo (SILVA etal., 1993).
Em relação à geologia, Jacomine (1996) dividiu a região em três áreas conforme a natureza
do material originário:
áreas do cristalino,
áreas do cristalino
recobertas por matérias
mais ou menos arenosos e áreas sedimentares.
O
relevo da região
é muito variável,
o que contribui para
o elevado numero de grandes
unidades de paisagem mencionado. A altitude
média fica entre 400m e
500m, mas pode atingir
1.000m. Ao redor de 37% da área é de encostas com 4% a 12% de inclinação
e 20% de encostas têm inclinação maior que 12%, o que
determina uma presença marcante
de processos erosivos nas áreas antropizadas (SILVA, 2000).
Quatro ordens de solos, de um total de quinze, ocupam 66% da área
sob a caatinga, espacialmente
fracionadas (Latossolos – 19%; Neossolos Litólicos – 19%; Argissolos – 15% e
Luvissolos – 13%). Segundo Silva (2000),
82%da região apresentam solos de baixo potencial
produtivo, seja por
limitações de drenagem e de elevados teores de sódio (Na)
trocável (CUNHA et al., 2008; SALCEDO;
SAMPAIO, 2008).
Clima e hidrografia
A
precipitação pluviométrica do Semiárido brasileiro é marcada pela variabilidade
inter-anual, que, associada aos baixos valores totais anuais de chuva,
contribui, como um dos principais fatores, para a ocorrência dos eventos de
“secas”. De acordo com estudo de Marengo (2006) e Rebouças et al. (2006), é
apresentada a cronologia das secas ocorridas a partir do século 16, que podem
ser associadas às crises de produção agrícola e de suprimento de água e
alimentos para a população e os rebanhos. A estes períodos de seca, também, se
relacionam os movimentos sociais que normalmente ocorrem na região. Segundo o
mesmo autor, ocorrem entre 18 e 20 anos de seca por período de 100 anos, com
ocorrência mais frequente a partir do século 20.
No
que se refere aos totais anuais, a climatologia das precipitações no Semiárido a qual abrange todo o Nordeste, se observa que, à
medida que se afasta do litoral leste, onde as chuvas são superiores a 1.000mm,
e se vai adentrando para o interior da região, nos limites do Semiárido, as
precipitações diminuem e alcançam valores médios inferiores a 500mm anuais. No
centro, que coincide com o núcleo do Semiárido, é onde se verificam os
menores índices totais anuais de chuva, em função de essa região coincidir com
o ponto final de influência das principais frentes que convergem para o
interior do Nordeste.
O
valor anual da precipitação nem sempre guarda correspondência com a qualidade
da estação chuvosa para o sucesso da atividade agropecuária, vez que podem
ocorrer períodos prolongados de estiagem, que se intercalam com episódios de
chuvas mais intensas, ocasionando a conhecida “seca verde”, que também afeta
negativamente a produção agrícola e a disponibilidade de forragem para os
animais. Dessa forma, a distribuição temporal da chuva é muito importante. As
chuvas são concentradas em apenas três ou quatro meses e ocorrem em poucos dias
do ano, sendo, em geral, intensas e intercaladas por períodos de veranicos.
A
quadra chuvosa para os estados do norte do Nordeste, como Ceará, Rio Grande do
Norte e parte da Paraíba, ocorre entre os meses de fevereiro e maio, enquanto
que no oeste da Paraíba e Pernambuco, leste do Piauí e norte da Bahia, os meses
mais chuvosos são janeiro, fevereiro, março e abril, sendo que em algumas
dessas regiões, já é possível observar a ocorrência de precipitação no mês de
dezembro.
A
irregularidade no regime pluviométrico, acompanhada pelo intenso calor, resulta
em elevadas taxas de evapotranspiração potencial e real, as quais reduzem a
umidade do solo e a quantidade de água armazenada nos reservatórios. Em outras
palavras, a precipitação reduzida e irregular e as altas taxas
evapotranspiratórias durante o ano resultam em um balança hídrico negativo.
No
Nordeste, a evaporação varia de 1000 mm.ano-1, no litoral da Bahia e
Pernambuco, atingindo 2.000 mm.ano-1 no interior do Semiárido,
podendo chegar a 3.000 mm.ano-1 (IICA, 2002) na área do chamado
“Cotovelo do São Francisco”, próximo a Petrolina, PE/Juazeiro, BA. Os valores
mais elevados ocorrem nos meses de outubro a dezembro e os mínimos, de abril a
junho.
A
vulnerabilidade dos agroecossistemas diante desse fenômeno natural e
constituir alternativas de desenvolvimento sustentável.
Aproveitamento
econômico sustentável dos recursos naturais – as bases de um plano de
desenvolvimento socioeconômico
sustentável para o Semiárido. No livro Solo e água no Polígono das Secas,
publicado pela primeira vez em 1949, Duque (1973) estabeleceu o
enfoque
ecológico associado ao desenvolvimento econômico e social, embora, na época,
não existisse o conceito de desenvolvimento sustentável com suas dimensões
social, econômica e ambiental. É enfatizado neste livro que o atraso do
Semiárido se explica por uma complexa articulação entre os condicionantes
ambientais, socioeconômicos, políticos e despreparo da população ou desprezo às
técnicas. À época, já era recomendado um forte programa de educação com enfoque
mais tecnológico, visando fornecer subsídios à população sobre os problemas
regionais e suas soluções. Também, foi dada ênfase à necessidade da multidisciplinar-idade, como forma de melhor compreender a região e identificar
tecnologias sustentáveis, nos conceitos atuais.
José Guimarães Duque |
Com
disponibilidade hídrica de mais de 85 bilhões de metros cúbicos de água, dos
quais, aproximadamente, 65% encontra-se nos reservatórios de Sobradinho (34,116
bilhões), Itaparica (11,782 bilhões), Xingó (3,800 bilhões), Moxotó (1,226
bilhões) e Boa Esperança (5,085 bilhões), todos localizados na bacia do São
Francisco (PROJETO ÁRIDAS, 1994).
Estima-se,
atualmente, que em todo o Nordeste existam por volta de 150.000 poços profundos
(CPRM, 2001). Entretanto, devido às
características geológicas, com o predomínio das cochas cristalinas, os
sistemas aqüíferos são do tipo fissural e apresentam baixas vazões, em geral,
inferiores a 3 m³.h-¹, com elevados teores de sólidos dissolvidos totais,
registrando, em media, 3 g.L-¹, com predominância de cloretos (LEAL, 1999).
A
condição de baixa disponibilidade hídrica nesta região poderá se agravar caso
se confirmem os cenários globais das alterações climáticas, indicados no Relatório sobre Mudanças Climáticas do Intergovernamental Panel on Climate Change
(IPCC). Especificamente, no caso do Brasil, os impactos mais severos seriam no
Semiárido, que tenderia a ficar mais seco em função de: a) redução de 15% a 20%
das chuvas e ocorrências de secas mas intensas; b) significativa redução no
nível de água dos reservatórios subterrâneos, com estimativas de até 70% até o
ano 2050;c) aumento da temperatura entre 3ºC e 4ºC para a segunda metade do
século 21, com sérias consequências na redução das vazões do Rio São Francisco
(15% a 20%) e aumento nas taxa de evaporação dos reservatórios de águas
superficiais, e d) alteração na composição da Caatinga, dando lugar a uma
vegetação mais típica de zonas áridas, com predominância de cactáceas (MARENGO,
2006).
Confirmadas
estas previsões, com o agravamento da escassez de água, segundo Brown et al.
(2000), surgiriam consequências graves na disponibilidade de alimentos,
considerando a necessidade média de mil toneladas de água para produção de uma
tonelada de grãos. A competição pela água influenciaria, portanto, na escassez
de alimentos para a população sempre crescente, principalmente nas regiões que
já sofrem com problemas de falta de alimentos e água, até mesmo para atender o
consumo humano.
No
contexto do uso da água na agricultura, Falkenmark (2002), citando por
Gnadlinger et AC. (2007), ressalta que o uso de tecnologias de captação e
manejo de água de chuva é indispensável em regiões áridas e semiáridas, pois
além de fornecer água para o consumo das famílias, possibilita seu uso pelas
plantas, denominada de “água verde” ou “água azul”, e para os animais.
Os
conhecimentos acumulados sobre os recursos naturais do Semiárido brasileiro,
principalmente no que concerne ao total anual das chuvas ocorridas, permitem
concluir que não é a falta de chuvas a responsável pela oferta insuficiente de
água na região, mas sua má distribuição, associada a uma alta taxa de
evapotranspiração, bem como a falta de políticas publicas para disponibilizar os
meios e orientar a população para captar e armazenar a água das chuvas para ser
utilizada no período seco. A esses fatores naturais e políticos, está associado
o uso inadequado da água nos mais variados setores – agrícola (irrigação),
indústria, uso doméstico, entre outros, gerando desperdícios e contaminação.
Assim, é essencial o uso racional da
água adotando-se iniciativas para reduzir o consumo e estimular novas atitudes
e comportamentos que gerem menos degradação. A sociedade deve pensar e agir com
foco no desenvolvimento econômico, porém, preservando os recursos naturais,
sobretudo a água. A educação e a conscientização do consumidor são fundamentais
para induzir mudanças em seus hábitos,
decisivas em regiões com limitação naturais de água.
decisivas em regiões com limitação naturais de água.
Diante
deste cenário, o maior desafio a ser enfrentado para produzir alimentos, talvez
não seja a escassez de água, mas uma gestão integrada e compartilhada com os
diferentes usuários dos recursos hídricos, como preconizada pela Política
Nacional de Recursos (BRASIL, 1997), fortalecida pelo uso de inovações
tecnológicas voltadas para captação, armazenamento e uso racional da água de
chuva, de forma a reduzir os riscos da produção agrícola.
Vegetação e Fauna
A
composição florística desse bioma não e uniforme e varia de acordo com o volume
das precipitações pluviométricas, da qualidade dos solos, da rede hidrográfica e da ação antrópica,
sendo que essa heterogeneidade, tanto em relação a fisionomia quanto a
composição, tem levado alguns autores a
utilizar sua denominação no plural – as caatingas brasileiras (ANDRADE-LIMA,
1981).
Aspectos
socioeconômicos
O
Semiárido brasileiro, com quase toda a região nordeste, apresenta os piores
indicadores econômicos e sociais do Pais. No tocante às atividades econômicas,
estas ainda padecem da
consequência direta da herança da arcaica estrutura agrícola regional com sérios problemas de concentração e desigualdade na distribuição de terras. Em decorrências, ainda predominam os sistemas agrícolas diversificados de base familiar, explorados com baixa eficiência de produção, responsáveis por uma crescente degradação de recursos naturais.
consequência direta da herança da arcaica estrutura agrícola regional com sérios problemas de concentração e desigualdade na distribuição de terras. Em decorrências, ainda predominam os sistemas agrícolas diversificados de base familiar, explorados com baixa eficiência de produção, responsáveis por uma crescente degradação de recursos naturais.
Com
uma economia em crise por causa da desorganização das suas principais
atividades econômicas, historicamente vinculadas ao complexo gado-algodão-lavouras
alimentares, grande parte da população do Semiárido vive de uma “economia sem
produção”, aqui entendida como aquela construída pelas subvenções sociais e
pelas transferências da União para as prefeituras e governos estaduais (GOMES,
2001). As transferências de renda promovidas pelo governo federal chegam a
beneficias mais de 60% das famílias dos municípios com população inferior a 50 mil
habitantes, com baixo PIB per capita, e têm melhorado substancialmente as
condições de vida das populações (HADDAD,2007).
Nestas
áreas dotadas de infra estrutura de irrigação, despontam vários pólos
agroindustriais, com carros-chefe dos setores dinâmicos da economia regional.
Os seis principais polos irrigados localizados na região semiárida (Petrolina, PE/Juazeiro, BA, oeste Baiano, Baixo Jaguaribe, CE, Alto Piranhas, PB, Açi-Mossoró, RN e norte de Minas) concentram 197.816 há irrigados, que correspondem a 27% da área irrigada no Nordeste (BANCO DO NORDESTE,2000). Uma área irrigada considerável em breve estará entrando em produção, com a entrada em operação de novos projetos de irrigação públicos em fase de implantação, em sua maioria, concebidos para os estabelecimentos de parcerias público-privadas na sua exploração. A pesquisa teve papel importante na geração de conhecimentos e tecnologias para a agricultura irrigada, como uso e manejo de água , uso de fertilizantes, introdução, avaliação e recomendação de variedades de frutas e hortaliças, dentre várias outras contribuições.
Os seis principais polos irrigados localizados na região semiárida (Petrolina, PE/Juazeiro, BA, oeste Baiano, Baixo Jaguaribe, CE, Alto Piranhas, PB, Açi-Mossoró, RN e norte de Minas) concentram 197.816 há irrigados, que correspondem a 27% da área irrigada no Nordeste (BANCO DO NORDESTE,2000). Uma área irrigada considerável em breve estará entrando em produção, com a entrada em operação de novos projetos de irrigação públicos em fase de implantação, em sua maioria, concebidos para os estabelecimentos de parcerias público-privadas na sua exploração. A pesquisa teve papel importante na geração de conhecimentos e tecnologias para a agricultura irrigada, como uso e manejo de água , uso de fertilizantes, introdução, avaliação e recomendação de variedades de frutas e hortaliças, dentre várias outras contribuições.
Vale
ressaltar o crescimento do numero de experiências organizacionais e produtivas
bem sucedidas,seja em condições de sequeiro, seja em regime de pequenas
irrigações, desenvolvidas em torno da agricultura familiar, que vêm superando a
vulnerabilidade dos agro-ecossistemas diante das secas e constituindo
alternativas econômicas sustentáveis. Diante da perda progressiva da capacidade
das atividades agrícolas tradicionais de gerar renda para os grupos sociais que
delas dependem, despontam atividade, agrícolas ou não, que local, que passam a
constituir um elemento importante na busca de alternativa para a crise da
economia da região. Várias delas derivam da dinamização de atividades
produtivas tradicionais de reconhecida importância econômica e social, como
pecuária de leite, ovinocaprinocultura, apicultura, cotonicultura,
fruticultura, dentre outras.
Algumas
dessas iniciativas de sucesso, potencializadas pela ação de organizações da
sociedade civil, vêm contribuindo para formar uma nova consciência para o
desenvolvimento do Semiárido, substituindo o conceito de “combate às secas” pelo de “convivência com o
Semiárido”, à muito tempo preconizado e defendido pela Embrapa Semiárido.
Considerações finais
O
Semiárido brasileiro apresenta uma elevada dependência dos recursos naturais e
os mais baixos indicadores sociais do País. No tocante às atividades
econômicas, ainda predominam os sistemas agrícolas explorando com baixa
eficiência de produção, responsáveis por uma crescente degradação dos seus
recursos naturais.
Entende-se
que é possível encontrar os meios necessários ao progresso técnico da
agricultura e promover maior eficiência da unidade de produção agrícola, a
partir da organização dos fatores produtivos de que ela dispõe. Nessa
perspectiva, não se trata somente de
buscar o aumento da produção e da produtividade dos produtos cultivados, mas,
principalmente, o sistema de produção que melhor se adapte a determinadas
condições ecológicas e socioeconômicas.
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