23 de nov. de 2014

ELEIÇÃO DE NOVA DIRETORIA E HOMENAGEM A “SEO ABÍLIO DO SINDICATO”.



Aconteceu no último dia 21 a eleição do Sindicato dos produtores Rurais de Ipirá. A chapa eleita para o triênio 2014/2017 tem Marco Antonio Silva Navarro como presidente, Genesito Cerilo Santiago como secretário e Erondino Macedo Oliveira como tesoureiro. Para conselho fiscal, delegados representantes e suplências foram eleitos: Ivo Barreto, José Caetano, Aurino Junior, Carlos Pedro, Jaime Mascarenhas, Evangivaldo Silva, Denildes Cintra Santos, Ivan Jorge, Francisco Alves e Evandro Lima.

Na tarde do mesmo dia a diretoria 2011/2014 encerrou suas atividades concedendo o Título de PRESIDENTE DE HONRA DO SINDICATO DOS PRODUTORES DE IPIRÁ ao Sr. Abílio Sampaio de Oliveira.

Vejam a seguir a história de “Seo Abílio do Sindicato”:

Abílio Sampaio de Oliveira, filho de Minelvina Sampaio de Oliveira e Viridiano Gonçalves de Oliveira nasceu em 22/02/1928 na Fazenda Boa Sorte em Pintadas, à época, distrito do Camisão. Autodidata, nunca frequentou escolas aprendendo a ler e escrever com familiares. Com dezessete anos se empregou como vaqueiro na Fazenda onde nasceu. Trabalhador incansável, com vida modesta conseguiu aos 29 anos reunir economias suficientes para realizar o sonho de comprar a pequena propriedade vizinha - Fazenda Tanquinho. Lá, se casou e teve filhos, sustentando sua família com o que sempre foi sua vocação, cultivar a terra e criar gado.
Em 1961 com filhos já em idade escolar, fez da própria casa uma escola para as crianças da região. Em 1968 comprou uma casa na cidade de Ipirá para que os filhos pudessem prosseguir seus estudos. Para ajudar com as novas despesas, abriu um pequeno comércio de “secos e molhados” no mercado municipal. Ainda em 1968 foi convidado por Antonio José de Oliveira (Antonio da Cacimba) para compor, como Conselheiro Fiscal a diretoria de fundação do Sindicato Rural de Ipirá. Dedicava agora todo seu tempo e força de trabalho à família, ao Sindicato, ao pequeno comércio e à Fazenda Tanquinho. Com a emancipação de Pintadas doou o terreno para a construção de um prédio escolar, em volta do qual viria a surgir o Povoado Santo Antonio, cuja praça tem hoje seu nome.
Em 7 de outubro de 1978, foi eleito Presidente do Sindicato. Recebendo a entidade completamente endividada contratou no Banco do Brasil um empréstimo para sanear as finanças. Com simplicidade e correção geriu o Sindicato que contava à época com sete funcionários, três dos quais médicos e um dentista. Quitou os débitos, depois o empréstimo, deixando em 1984, ao final de cinco anos e meio de mandato, saldo em caixa suficiente para que seu sucessor, Dr. Luiz Carlos Martins adquirisse a antiga casa de Dr. Diomário Sá na Praça Roberto Cintra, que hoje se constitui em único e
Marco Antonio Silva Navarro
Presidente 2014/2017
valioso patrimônio do Sindicato dos Produtores Rurais de Ipirá.
Sr. Abílio é, e sempre foi, o mais assíduo associado deste Sindicato. Como presidente, membro da diretoria ou como funcionário, participou ativamente de toda sua história, de seus bons e maus momentos, sem nunca desacreditar da importância do sistema sindical rural. Em Ipirá todos o conhecem como “Seo Abílio do Sindicato”, uma evidencia clara de sua nobre dedicação a esta casa e do respeito e carinho que conquistou dos conterrâneos.
Numa época marcada pelo individualismo, o exemplo de cidadania de quem sempre encontrou tempo para o interesse coletivo deve ser enaltecido e homenageado. Por esta razão, a atual diretoria desta casa e a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado da Bahia, conferem ao Senhor Abílio Sampaio de Oliveira, o título de Presidente de Honra do Sindicato dos Produtores Rurais de Ipirá.



 José Caetano Ricci de Araujo
Presidente 2011/2014.

16 de set. de 2014

CAATINGAS, DEGRADAÇÃO E OPORTUNIDADES

          O senso comum vê o "nordeste" como uma região de aparência uniforme e clima seco. O senso crítico mostra, entretanto, que o vasto território nordestino apresenta um dos mais diversificados climas do Brasil. Por convenção a geografia divide o Nordeste em quatro sub-regiões: Zona da Mata que acompanha o Oceano Atlântico do Rio Grande do Norte até o sul da Bahia, onde encontramos o pouco que restou da exuberante Mata Atlântica; Meio Norte que compreende grande parte do Piauí e todo o Maranhão, onde estão as matas dos cocais e babaçuais; Sertão, que é a parte mais interior de praticamente todos os estados nordestinos e Agreste, estreita faixa entre a Zona da Mata e o Sertão interiorano, com características das duas sub-regiões adjacentes, partes quase tão secas como o Sertão e outras bastante chuvosas. O Nordeste brasileiro é, portanto “um conjunto de regiões muito diferentes [...] onde há um pouco de tudo”, como ensinava o eminente agrônomo Frederico Pimentel Gomes. 

"Caatingas - grandes tablados onde campeia a sociedade rude dos vaqueiros”.
Euclides da Cunha

         
Agreste, Sertão e uma pequena parte do Meio Norte compõem o semi-árido nordestino, caracterizado pela baixa umidade do ar, baixa pluviometria e frequentes “secas”. Resistindo às adversidades do clima semiárido através de adaptações naturais, esta a Caatinga com suas várias feições, desde as arbóreas úmidas e densas até as arbustivas abertas e extremamente secas. Estas últimas representam o “nordeste” do imaginário popular que teve em Euclides da Cunha sua melhor descrição: “Arbúsculos quase sem pega sobre a terra escassa, enredados de esgalhos de onde irrompem solitários cereus rígidos e silentes, dando ao conjunto a aparência de uma margem de desertos”. 
Eu acho o Sertão bonito exatamente por causa daquilo que os delicados acham feio... o Sol implacável... e a Caatinga espinhosa e selvagem, povoada de répteis envenenados, de aves de rapina, escorpiões, marimbondos e piolhos-de-cobra”.
Ariano Suassuna

          O entendimento dos cientistas é que a semi-aridez do nordeste brasileiro foi provocada por alterações geológicas e climáticas ocorridas em época bastante remota, anterior, inclusive, ao surgimento da espécie humana no planeta. Consequentemente, sua vegetação não é resultado da degradação provocada pelo homem como ocorreu em outras regiões semi-desérticas do mundo. Mas, se o homem não esta na origem da Caatinga, por certo, causou-lhe modificações significativas. O semiárido nordestino sofreu uma forte pressão de ocupação desde os tempos coloniais, quando a necessidade de atender à demanda de alimentos da população que se multiplicava no litoral determinou o avanço da pecuária para os sertões, onde o clima arejado e seco era propício aos rebanhos. Com o povoamento dos sertões, a caatinga, que na língua Tupi significa “mata esbranquiçada”, em referência a seu aspecto na estação seca, progressivamente foi sendo exaurida pelas queimadas para melhorar os pastos e para abrir as roças de algodão, pela extração de madeira para lenha, cercas, currais, galpões, casas e dormentes de ferrovia. Também pela exploração de ouro, cobre, ferro, mica, caulim, gesso, pedras preciosas e semipreciosas.

                                                            “Foi o gado bovino quem guiou o povoador para os sertões; e não o rancheiro quem trouxe o gado para cá!”
Dilemar Costa

Vaqueiro tangerino - Percy Lau
          O longo histórico de exploração fez da Caatinga, muito provavelmente, o ecossistema mais degradado do Brasil depois da Mata Atlântica. Salvo valiosas exceções, grande parte da vegetação remanescente, perdeu suas características originais. Restou uma “caatinga” desfigurada que não conssegue proteger o solo das chuvas torrênciais características do semiárido. Uma “caatinga” secundária onde a erosão esta presente e a fauna praticamente desapareceu. Na estação seca, árvores e arbustos perdem suas folhas avidamente pastejadas por cabras, ovelhas e vacas. As primeiras chuvas atingem o terreno desprotegido, provocando a retirada de sedimentos. A degradação dos solos avança e, exaurida, a natureza recua.
          Em nenhuma outra parte do mundo existe bioma igual à caatinga. Suas espécies nativas, expressando as possibilidades de adaptação da natureza a regiões de elevado potencial de evapotranspiração com baixa e irregular precipitação, ganharam enorme relevância ante a probabilidade do aquecimento global. Restrito ao território
brasileiro suas peculiaridades exigem tecnologias próprias e atenção especial. Apesar disto, continuamos convivendo com sistemas de produção incompatíveis e agressivos, responsáveis pela “degradação generalizada” que tem provocado menor capacidade de recuperação a secas e facilitado o surgimento de núcleos de desertificação. Felizmente “no meio da dificuldade encontra-se a oportunidade”. De fato, estudos revelam que as maiores oportunidades para sequestro e armazenamento de CO² no solo estão, justamente, em terras secas degradadas (Review of evidence on drylands pastoral systems and climate change - 2009). Desta forma, reverter o processo de degradação da caatinga deixou de ser apenas uma necessidade, constituindo-se agora numa oportunidade para combater o “efeito estufa”.

JOSÉ CAETANO RICCI DE ARAÚJO
Eng° Agrônomo e Produtor Rural
Ipirá – Bahia

9 de ago. de 2014

A DEFESA DAS RAÇAS AUTOCTÓNES

*Apolinário José Barbosa da Cruz Vaz Portugal (Murtosa, 9 de Novembro de 1930 - Santarém, 2 de Janeiro de 2008) foi um veterinário, político e professor português. Ocupou diversos cargos em governos portugueses, incluindo o de Ministro da Agricultura nos III e IV Governos Constitucionais. Foi director da Estação Zootécnica Nacional e da Faculdade de Medicina Veterinária de Lisboa.

A DEFESA DAS RAçAS AUTOCTÓNES:Uma NECESSIDADE pelas características diversas do alimento de origem animal que produzem e uma EXIGÊNCIA pela animação do Meio Rural

1 - Há formas diversas de produzir o mesmo tipo de alimento de origem animal, reflectindo-se estas formas nas características e organização tecidual do produto final: leite, carne, conservados e transformados. O Consumidor no mercado especial ou em mercados abertos a produtos com origens diversas (grandes superfícies) escolherá o alimento de origem animal que mais o satisfaça em função do preço ou das suas características diversas, estas a gerarem a sua apetência face a gostos, odores e flavores diferentes.

Reforça-se a ideia de que há formas diversas de produzir, todas elas com características próprias e exigências adequadas aos sistemas de produção animal a implantar. Em todos os sistemas, intensivos versus naturais, é essencial que se aumente a eficiência produtiva, eliminando os períodos improdutivos do animal e se procurem custos de produção mais competitivos. Enfim, há que saber produzir, defendendo a Imagem Pública da Produção Animal. Há que saber fazer marketing ou saber vender com valor acrescentado que justifique as diferenças no alimento que se vende e na forma de produzir, nomeadamente no caso de sistemas de produção animal naturais e extensivos em que o que está em causa é o aproveitamento de recursos locais genéticos, alimentares ou os dois em conjunto. O "beef" da erva e o porco da bolota, são exemplos.

Em todos os objectivos diferenciados de produção animal, há que Saber Produzir e, se possível, dar dimensão às estruturas de produção, incluindo nestas, para as áreas do minifúndio, a organização, como exploração pecuária, das Associações de Produtores, a assumirem a debilidade estrutural de quem produz e se possível, especializarem funções produtivas entre os seus membros. Há que dar vida ao Mundo Rural nestas condições específicas de produção. Ter gente neste Mundo Rural torna-se uma exigência, para se evitar a desertificação e a má imagem do cenário rural.

2- Os Sistemas Intensivos de Produção ou Indústria Animal procuram, através da maximização da eficiência biológica e zootécnica, a produção massal de alimentos. O Homem manipula o sistema de produção e obtém mais produto animal para a mesma quantidade de alimento ingerido, obtendo assim custos de produção mais competitivos e contribuindo largamente para o mercado de abastecimento caracterizado pela procura generalizada de alimentos. Os Sistemas Locais de produção animal ou a arte de produzir são a outra forma de produzir e dirigem-se a mercados restritos, contribuindo para a oferta limitada de alimentos de origem animal de escolha. Dirigem-se a nichos de consumidores. O Homem observa estes sistemas de produção animal que promovem a utilização de recursos locais renováveis (animais e alimentos). Tem a ver obviamente com o Desenvolvimento do Meio Rural. A capacidade de oferta e não da procura, dimensiona a necessidade de produzir nestas condições. A eficiência do sistema produtivo exige outra interpretação biológica e zootécnica!

São sistemas de produção animal complementares, porque são diferentes e exigem tecnologias apropriadas e adaptadas ao sistema de produção. Os objectivos biológicos e tecnológicos determinam as diferenças entre estes sistemas de produção animal, que geram necessariamente e sempre produtos (alimentos) de alta qualidade. São sistemas de produção animal que, em todas as circunstâncias, devem ser amigos do ambiente e não agredirem a saúde pública.

3 - Ao programar o desenvolvimento da Pecuária Nacional (Programa Nacional de Desenvolvimento Pecuário) há que considerar estas duas situações de produção, conjugando apoios dirigidos e necessariamente diferentes, nomeadamente, em termos financeiros: apoios à Pecuária Indústria (tornar competitivos os custos de produção e à Pecuária Arte, (destacar e reforçar as diferenças). A Pecuária Arte tem, necessariamente, face às nossas condições de produção de ser considerada, também,  como Serviço (dinamizar e dar vida ao Meio Rural, promover a diversidade da Paisagem Rural e manter a Biodiversidade). Há que identificar o que queremos e como o podemos ter com a gente que temos. A diversidade e potencialidades de Meios de Produção e a organização produtiva dos mesmos é diversa na UE. Os recursos a considerar e a aproveitar, nos Países do Sul da Europa, impostos pela tradição, cultura e diversidade são uma forma de apego (fixação) de gente ao Meio Rural, argumento de grande peso e visão humanista na economicidade das circunstâncias. Os indicadores a utilizar, em termos comparativos e relativos entre Países da UE, terão que expressar intervenções adequadas aos objectivos diferenciados. Neste domínio a pecuária das raças autóctones, para além da conquista do valor acrescentado para o que se sabe vender e das aplicações das medidas agro-ambientais, fruto discutível de uma visão e filosofia generalizada do que não é generalizável na UE, terá de viver com apoio dirigido e sentido da política para o Programa Nacional de Desenvolvimento Pecuário. Defender o que se tem, promover o que se produz (até pensar em mercados internacionais!) e dar qualidade de vida a quem vive, no Meio Rural, torna-se indispensável. Há que considerar a estrutura da produção animal. Ter mais gente vocacionada, feliz e apaixonada no Meio Rural é contribuir para o Bem Estar Nacional.

Há que estabelecer e organizar o controle do que se vende por forma a permitir assegurar as diferenças, garantindo a genuidade do alimento que se vende e que dá prazer e satisfação a quem compra. Há que variar para não limitar a capacidade de escolha pelo Consumidor! Há que defender a genuidade da escolha, controlando como se faz e que origem tem o alimento de origem animal.

4 - Os sistemas naturais de produção pecuária (tipo extensivo), maximizando o uso instalado das raças autóctones promoverá o que todos sentimos como necessário e como preocupação sentida: o desenvolvimento do Meio Rural, a complementar e ornamentar o desenvolvimento económico do País, a perseguir outras metas e outros indicadores em outras circunstâncias de produção.

Na Era Tecnológica do Futuro em produção animal há espaço para defender e cultivar a produção local, a produção das raças autóctones, pela riqueza nutricional dos alimentos que origina, respondendo à riqueza das nossas tradições e à cultura da nossa gastronomia. Apoiar este desenvolvimento da pecuária nacional torna-se uma preocupação de sempre, a necessitar que haja apoios diferenciados à mesma produção, que estimulem, no local próprio, a preferência por esta produção. Há que dar-lhe continuidade e esperança, assegurando que é um desafio fazê-la, necessariamente, por agricultores mais novos (garantir continuidade) pois estes têm de sentir que, através dela, adquirem Qualidade de Vida.

Não somos País rico mas somos País consciente de que sabemos distribuir a riqueza pelas necessidades sentidas na Sociedade do Mundo Rural. Daí a nossa especificidade a determinar tratamento adequado às nossas circunstâncias de produção animal nestas condições face aos desejos de evolução social.

5 - A Política Agrícola do País deve sentir a necessidade desta produção animal, feita à base das raças autóctones criar apoios que assegurem a segurança e o entusiasmo de quem produz ou vem a suceder a quem produz. Considerem-se que medidas agro-ambientais da política comunitária são importantes mas não devem ser exclusivas. Há o caso nacional a defender e há que melhorar e dirigir Meios à especificidade deste tipo de produção, rico no Sul da Europa e vestindo características próprias.

A constatação de existirem diferentes condições naturais (sistemas de produção animal a privilegiar), estruturais de produção (dimensão das explorações) e sócio-económicas (In-put por capita) entre Países do Sul da Europa e do Norte e Centro da Europa há que assegurar, por razões nacionais, a necessidade de defender e organizar esta produção natural à base das raças autóctones. Há que

1 de jul. de 2014

O BOM CALOR TROPICAL



 Por: Manoel Dantas Vilar Filho (Dr Manelito)
Manoel Dantas Vilar Filho
(Dr Manelito)

Não temos um terço do tempo sob friagens radicais e neves espessas. O zootecnista inglês T. R. Preston (1977) num ensaio designado "Estratégia para produção de bovinos nos Trópicos", garantia que "... os trópicos oferecem possibilidade de rendimento por unidade de área e de viabilidade econômica, que superam em muito as perspectivas atuais e mesmo futuras dos países de clima temperado". Adiante, criticando: ".... as crenças ensinadas nos compêndios de Zootecnia sobre a especialização de bovinos para produzir leite ou carne", propõe que se confie"... sobretudo na função do rúmen" e não se ponham os animais a competir com o Homem pelo consumo de cereais e, por fim, afirma que "... já que necessitamos tanto de carne como de leite, a base de toda a estratégia pecuária racional é considerar as duas produções conjuntamente", fundamentando a genética de dupla aptidão.

A não ser para a pequena parte irrigável artificialmente, onde produzimos qualificadas frutas, existe um triste contraste entre as realidades - boas e más - da zona seca e os mecanismos institucionais de lidar com elas, desde o Ensino/Pesquisa até a política de produção e Assistência.
Não temos um terço do tempo sob 
friagens radicais e neves espessas.

A chamada Civilização do Couro foi a fase mais próspera da economia nordestina. Técnicos argentinos, falando sobre o Chaco Seco de lá (1980) - que tem a mesma extensão que o nosso Polígono das Secas, afirmam: "... de acordo com nossa experiência, quanto mais seca a região, sempre que se disponha de pasto e água, tanto maior é a produção pecuária. E mais: "... estamos em condições de afirmar que todo plano puramente agrícola nestas regiões está, de antemão, condenado ao fracasso. O risco das colheitas é demasiado grande para ser a base da exploração". 

O Brasil, com o Nordeste seco bem incluído tem a vocação e o destino de ser, também, a grande nação agropecuária, sobretudo pecuária, do mundo. Basta neutralizar mentes coloniais e ter a dignidade de estabelecer uma política decente de financiamentos rurais, calcada em parâmetros tecnicamente corretos e ajustados para cada região fisiográfica. Tomando o Brasil como referência para pensar o Brasil e a peculiar semiaridez do Nordeste para o Nordeste.

O Nordeste é seco. O inverno é um pequeno intervalo de tempo entre dois estios que, às vezes, se emendam. A grande vocação das terras secas é pecuária de ruminantes e isso já começa a ser considerado, graças a Deus. Por mais óbvia que seja, quase sempre é preciso repetir uma mesma idéia até cansar! Há uma dramática não-decisão em relação à semi-aridez do Nordeste. Os moradores do semi-árido são credores do Brasil.
Os moradores do semi-árido 
são credores do Brasil.

João Suassuna
À medida que se está ideologicamente revogando a "filosofia da água", do "combate à seca" - a água passando a ser buscada para resolver o problema da sede, o uso primordial e sem alternativa que água tem e não o da fome, como "fator de produção" excludente, e vai clareando o caminho técnico-cultural-político de viver em sintonia com a Natureza desse mundo áspero, bonito, possível e mal tratado do sertão das águas desarrumadas, a pecuária de múltipla função, sobre vegetais perenes, integrada por bovinos, caprinos e ovinos, bem adaptados ao ambiente, recriará a civilização do couro em novas bases e o semi-árido poderá se transformar, também do ponto de vista da produção e da prosperidade, num belo pedaço do Brasil. A raça das plantas, como a raça dos animais, para cada latitude é um fator fundamental.

Ariano Suassuna
O semi-árido - Por uma perniciosa deformação cultural, em larga medida, brasileiros ainda se mantêm com o umbigo e a mente, presas do estrangeiro, como que cultiva um complexo de inferioridade, colonial, negativo, menor. Um estadista paraibano - João Suassuna - já escreveu num documento de Governo (1926): "somos um povo sugestionado pela política inferior do decalque". No trabalho na terra, essa anomalia se exacerba, porque a diferença entre o mundo temperado e o tropical, mais que noutro campo do conhecimento e da vida, deveria impedir a prática do "adotar sem adaptar", conceitos e técnicas somente aplicáveis em regiões de clima regular. Um país pode crescer com o aumento do seu PIB. Uma nação só cresce com um caráter, uma fidelidade ao seu passado, uma luta pela sua identidade. 

Uma expressão de Ariano Suassuna, falando sobre Arte em geral, bem completaria essa afirmação, dizendo que só assim "... o que vier de fora, em vez de uma influência que nos descaracteriza e esmaga, passa a ser uma incorporação que nos enriquece". A identidade o caráter das plantas, dos animais, do chão da terra e a forma de trabalhar nele pedem consideração análoga, para que possam prestar. 
Marcus Catão, tribuno romano

O pesquisador e mestre zootecnista sul-africano Jan C. Bonsma, em conferência no Brasil (1982) sugeriu: "Sejam impiedosos no descarte seletivo para o melhoramento do gado, quando a:
1) adaptabilidade às condições locais;
2) fertilidade;
3) precocidade;
4) conversão de alimentos;
5) docilidade;....."

Marcus Catão, tribuno romano, no ano 184, em sua obra "De Agriculturae", consultado sobre qual o melhor emprego das terras no trabalho rural, respondeu: 1a) proveitosa criação de gados; 2) criação do gado com lucros modestos; 3) criação de gados sem lucros; 4) aramento (aração) de terras. Pensar no que ele disse, pensando no semiárido, quando se valoriza muito a proteção do ambiente e do solo é, ainda, mais pertinente.

O pessoal da OCDE, discutindo a proximidade do "food power" prevalecer no concerto das grandes potências do mundo, já dizia (1983): "... entre os tesouros mundiais, destacamos o espaço agriculturável do Brasil...." e mais "... que poderá produzir a carne mais barata do mundo, porque detém o milagre mundial do boi de fotossíntese...". A conversa deles cheira, historicamente, a exploração, egoísmo, imposição, impiedade social, ou, para usar equivalentes atuais, a "competitividade" e "mercado globalizado".
"Competitividade" e "mercado globalizado"
Manoel Dantas Vilar Filho (Dr Manelito)
Taperoá, Agosto de 2001
(Publicado em "O Berro - nº 46 - Novembro/Dezembro 2001)

PENSAMENTO DO MÊS

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