Por: Manoel
Dantas Vilar Filho (Dr Manelito)
Manoel Dantas Vilar Filho (Dr Manelito) |
Não temos um terço do tempo sob friagens radicais e neves espessas. O zootecnista inglês T. R. Preston (1977) num ensaio designado "Estratégia para produção de bovinos nos Trópicos", garantia que "... os trópicos oferecem possibilidade de rendimento por unidade de área e de viabilidade econômica, que superam em muito as perspectivas atuais e mesmo futuras dos países de clima temperado". Adiante, criticando: ".... as crenças ensinadas nos compêndios de Zootecnia sobre a especialização de bovinos para produzir leite ou carne", propõe que se confie"... sobretudo na função do rúmen" e não se ponham os animais a competir com o Homem pelo consumo de cereais e, por fim, afirma que "... já que necessitamos tanto de carne como de leite, a base de toda a estratégia pecuária racional é considerar as duas produções conjuntamente", fundamentando a genética de dupla aptidão.
A não ser para a pequena parte irrigável artificialmente, onde produzimos qualificadas frutas, existe um triste contraste entre as realidades - boas e más - da zona seca e os mecanismos institucionais de lidar com elas, desde o Ensino/Pesquisa até a política de produção e Assistência.
Não temos um terço do tempo sob friagens radicais e neves espessas. |
A chamada Civilização do Couro foi a fase mais próspera da economia nordestina. Técnicos argentinos, falando sobre o Chaco Seco de lá (1980) - que tem a mesma extensão que o nosso Polígono das Secas, afirmam: "... de acordo com nossa experiência, quanto mais seca a região, sempre que se disponha de pasto e água, tanto maior é a produção pecuária. E mais: "... estamos em condições de afirmar que todo plano puramente agrícola nestas regiões está, de antemão, condenado ao fracasso. O risco das colheitas é demasiado grande para ser a base da exploração".
O Brasil, com o Nordeste seco bem incluído tem a vocação e o destino de ser, também, a grande nação agropecuária, sobretudo pecuária, do mundo. Basta neutralizar mentes coloniais e ter a dignidade de estabelecer uma política decente de financiamentos rurais, calcada em parâmetros tecnicamente corretos e ajustados para cada região fisiográfica. Tomando o Brasil como referência para pensar o Brasil e a peculiar semiaridez do Nordeste para o Nordeste.
O Nordeste é seco. O inverno é um pequeno intervalo de tempo entre dois estios que, às vezes, se emendam. A grande vocação das terras secas é pecuária de ruminantes e isso já começa a ser considerado, graças a Deus. Por mais óbvia que seja, quase sempre é preciso repetir uma mesma idéia até cansar! Há uma dramática não-decisão em relação à semi-aridez do Nordeste. Os moradores do semi-árido são credores do Brasil.
Os moradores do semi-árido são credores do Brasil. |
João Suassuna |
Ariano Suassuna |
Uma expressão de Ariano Suassuna, falando sobre Arte em geral, bem completaria essa afirmação, dizendo que só assim "... o que vier de fora, em vez de uma influência que nos descaracteriza e esmaga, passa a ser uma incorporação que nos enriquece". A identidade o caráter das plantas, dos animais, do chão da terra e a forma de trabalhar nele pedem consideração análoga, para que possam prestar.
Marcus Catão, tribuno romano |
O pesquisador e mestre zootecnista sul-africano Jan C. Bonsma, em conferência no Brasil (1982) sugeriu: "Sejam impiedosos no descarte seletivo para o melhoramento do gado, quando a:
1) adaptabilidade às condições locais;
2) fertilidade;
3) precocidade;
4) conversão de alimentos;
5) docilidade;....."
Marcus Catão, tribuno romano, no ano 184, em sua obra "De Agriculturae", consultado sobre qual o melhor emprego das terras no trabalho rural, respondeu: 1a) proveitosa criação de gados; 2) criação do gado com lucros modestos; 3) criação de gados sem lucros; 4) aramento (aração) de terras. Pensar no que ele disse, pensando no semiárido, quando se valoriza muito a proteção do ambiente e do solo é, ainda, mais pertinente.
O pessoal da OCDE, discutindo a proximidade do "food power" prevalecer no concerto das grandes potências do mundo, já dizia (1983): "... entre os tesouros mundiais, destacamos o espaço agriculturável do Brasil...." e mais "... que poderá produzir a carne mais barata do mundo, porque detém o milagre mundial do boi de fotossíntese...". A conversa deles cheira, historicamente, a exploração, egoísmo, imposição, impiedade social, ou, para usar equivalentes atuais, a "competitividade" e "mercado globalizado".
Taperoá, Agosto de 2001
(Publicado em "O Berro - nº 46 -
Novembro/Dezembro 2001)
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