27 de abr. de 2013

CAATINGAS NORDESTINAS

 “Grandes tablados onde campeia a 
sociedade rude dos vaqueiros”.
Euclides da Cunha 
O senso comum vê o "nordeste" como uma região de aparência uniforme e clima seco. O senso crítico, entretanto, mostra que o vasto território nordestino apresenta um dos mais diversificados climas do Brasil. Por convenção a geografia divide o Nordeste em quatro sub-regiões: Zona da Mata que acompanha o Oceano Atlântico do Rio Grande do Norte até o sul da Bahia, onde encontramos o pouco que restou da exuberante Mata Atlântica; Meio Norte que compreende grande parte do Piauí e todo o Maranhão, onde estão as matas dos cocais e babaçuais; Sertão, que é a parte mais interior de praticamente todos os estados nordestinos e Agreste, estreita faixa entre a Zona da Mata e o Sertão interiorano, com características das duas sub-regiões adjacentes, partes quase tão secas como o Sertão e outras bastante chuvosas. O Nordeste brasileiro é, portanto “um conjunto de regiões muito diferentes [...] onde há um pouco de tudo”, como ensinava o eminente agrônomo Frederico Pimentel Gomes. 
Agreste, Sertão e uma pequena parte do Meio Norte compõem o semiárido nordestino, caracterizado pela baixa umidade do ar, baixa pluviometria e freqüentes “secas”. Resistindo às adversidades do clima semiárido através de adaptações naturais, esta a Caatinga com suas várias feições, desde a arbórea úmida e densa até a arbustiva abertas e extremamente seca. Esta última representa o “nordeste” do imaginário popular e teve em Euclides da Cunha sua melhor descrição: “Arbúsculos quase sem pega sobre a terra escassa, enredados de esgalhos de onde irrompem solitários cereus rígidos e silentes, dando ao conjunto a aparência de uma margem de desertos”. 
“Eu acho o Sertão bonito exatamente por causa daquilo 
que os delicados acham feio...
o Sol implacável... e a Caatinga espinhosa e selvagem,
 povoada de répteis envenenados, de aves de rapina,
escorpiões, marimbondos e piolhos-de-cobra”.
Ariano Suassuna
O entendimento dos cientistas é que a semiaridez do nordeste brasileiro foi provocada por alterações geológicas e climáticas ocorridas em época bastante remota, anterior, inclusive, ao surgimento da espécie humana no planeta. Consequentemente, sua vegetação não seria resultado da degradação provocada pelo homem como ocorreu em outras regiões semidesérticas do mundo. Mas, se o homem não esta na origem da Caatinga, por certo, causou-lhe modificações significativas. O semiárido nordestino sofreu uma forte pressão de ocupação desde os tempos coloniais, quando a necessidade de atender à demanda de alimentos da população que se multiplicava no litoral determinou o avanço da pecuária para os sertões, onde o clima arejado e seco é propício aos rebanhos. Com o povoamento dos sertões, a caatinga, que na língua Tupi significa “mata esbranquiçada”, em referência a sua aparência na estação seca, progressivamente foi sendo exaurida pelas queimadas para melhorar os pastos e para abrir as roças de algodão, pela extração de madeira para lenha, cercas, currais, galpões, casas e dormentes de ferrovia, também pela exploração de ouro, cobre, ferro, mica, caulim, gesso, pedras preciosas e semipreciosas. 
“Foi o gado bovino quem guiou o povoador para os sertões;
e não o rancheiro quem trouxe o gado para cá!” 
Dilemar Costa 
O longo histórico de exploração fez da Caatinga, muito provavelmente, o ecossistema mais degradado do Brasil depois da Mata Atlântica. Salvo valiosas exceções, grande parte da vegetação remanescente, perdeu suas características originais. Restou uma “caatinga” desfigurada que não conssegue proteger o solo das chuvas torrênciais características do semiárido. Uma “caatinga” secundária onde a erosão esta presente e a fauna praticamente desapareceu. Na estação seca, árvores e arbustos perdem suas folhas, avidamente pastejadas por cabras, ovelhas e vacas. As primeiras chuvas atingem o terreno desprotegido, provocando a retirada de sedimentos. A degradação dos solos avança e, exaurida, a natureza recua.
Caatinga degradada
Em nenhuma outra parte do mundo existe bioma igual à caatinga. Restrito ao território brasileiro suas peculiaridades exigem tecnologias próprias e atenção especial. Suas espécies nativas, expressando as possibilidades de adapatação da natureza às regiões de elevado potencial de evapotranspiração com baixa e iregular precipitação, ganharam enorme relevância ante a probabilidade do aquecimento global. Sistemas de produção incompatíveis e agressivos são responsáveis pela “degradação generalizada” que tem provocado menor capacidade de recuperação a secas e facilitado o surgimento de núcleos de desertificação. Paradoxalmente esta degradação representa um “potencial inexplorado” para combater o “efeito estufa”. Estudos revelam que as maiores oportunidades para sequestro e armazenamento de CO² no solo estão, justamente, em terras secas degradadas (Review of evidence on drylands pastoral systems and climate change - 2009).  Neste novo cenário a caatinga ganha crescente visibilidade, o que talvez contribua para que receba a atenção e os cuidados de que precisa. Em contrapartida, poderá prestar a todos nós um duplo serviço: primeiro ambiental, seqüestrando carbono, e aumentando a capacidade das regiões secas em adaptar-se aos impactos de possíveis mudanças climáticas, depois econômico, reforçando a produtividade da pecuária e a segurança alimentar das populações.
JOSÉ CAETANO RICCI DE ARAÚJO
Eng° Agrônomo e Produtor Rural
Ipirá – Bahia














Postado originalmente em http://bahiaredsindi.blogspot.com.br/ em 17/07/2011

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